sexta-feira, 22 de novembro de 2013

GOOD BYE, LENIN!


Tudo era apenas uma brincadeira que foi crescendo, crescendo and you really got a hold on me. Vc me foi um consolo do Peninha, um grito desesperado dos Beatles. Vc foi meu mais precioso Rapaz de Notting Hill, mas também não sei se foi mesmo, sabe? Porque o presente é sempre mais importante que o passado e não é que o passado não tenha sido um presente. Vc foi uma ideia que, na verdade, nunca existiu além da minha loucura. Porque a real é que vc é nada demais.

Por vc atravessei muros inteiros de Berlim. Perdi o argumento, abandonei meu coração e fui carne & osso. Mais carne, é verdade, bem mal passada.  Por vc eu fui uma garota de sete anos pisando em ovos numa loja de cristais. Por vc eu fui Davi, quando poderia ter sido Golias.  Fui Trotski, quando poderia ter sido Marx.

E por vc eu teria sido a Jessica Rabbit, a Ana Bolena, a Virgem Maria e quem mais vc quisesse. Eu teria sido sexo matinal, café, almoço, jantar. Teria sido ausência quando vc fosse solidão e doçura quando vc fosse presença. Eu teria lavado, passado, cozinhado. Eu, logo eu. Por vc, só por vc.

Já vc? Vc foi o espelho dizendo que eu não era a mais bela do reino. Vc foi Maquiavel retrucando que os fins justificam os meios. Foi a Bruxa Má me oferecendo uma maçã envenenada. Foi Lúcifer não se contentando em ser apenas um anjo, mesmo sendo o preferido. Até que foi Poder convertido em Pretensão, Arrogância, Egoísmo. Um blockbuster sucesso de bilheteria, fracasso de crítica, puro capitalismo selvagem.

Tomara que seu café seja sem açúcar, que sua dança seja sem par. Tomara que sua namorada seja frígida, burra, feia e conte umas piadas sem graça. Tomara que vc perca cabelo, engorde e fique igual ao Danny de Vito. Tomara que vc broxe. De novo e de novo.

Depois de vc, eu corri atrás de mim. Depois de vc, eu transformei toda a minha ansiedade numa pelada de domingo. Depois de vc.

Vc não tinha culpa e agora tem não apenas culpa, mas meu pior, mesmo que eu nunca lhe tenha sido o melhor. Dos meus erros, o que eu jamais deveria ter cometido. Da minha pele, o que jamais deveria ter sido e que nunca mais será. Nunca mais.

Eu te odeio o resto da vida e só até amanhã. Mas sigo odiando porque a real é que vc é nada demais.  

Kiss me hard before you go. Good Bye, Lenin!


PS: Qualquer semelhança com a vida real é mera coincidência. Na verdade, é tudo um grande exagero.

sábado, 20 de julho de 2013

ROMEU SEM JULIETA

* Sugiro que leia a este som: 
http://www.youtube.com/watch?v=8A4HaR9LJzI&list=PLBA140C6F2AFD31CB  


Maria Julieta. Ela odiava seu nome e só usava o segundo. Mas usava Maria quando, em Crisma, perguntava ao Padre como a mãe de Jesus ficou grávida sem sexo. Não era subversiva, nem tinha essa pretensão de mártir. Só queria ver o pároco rubrar de vergonha, por pura diversão.

Prólogo: E sexo era também diversão. Desde menina, Julieta não entendia porquê tanto tabu, se sexo era como dormir, tomar água, fazer xixi, chorar. Necessidades básicas e naturais dos neandertais.

Julieta era metódica, organizada, fronteiriça. Guardava tudo em compartimentos hermeticamente fechados e, nos imprevistos, despia um santo pra vestir outro, mas logo arrumava um pedacinho de pano pra cobrir o pelado, coitado.

Julieta não misturava nada além do leite com café. O resto era profissional e pessoal, água e óleo, amigos do curso, amigos da firma, amigos de casa. Na sua gaveta, as roupas eram separadas por cores e tamanhos. Sabia o quanto ia gastar até o fim do ano e, até lá, controlava todos os desejos consumistas, colocando-os num potinho. O único fio solto era o sexo. Era sua válvula de escape, seu quase extravase.

-      Quando foi a última vez que vc fez algo espontaneamente, Julieta?
-   Não lembro. Acho que não faço nada espontaneamente, tá tudo planejado aqui dentro, doutô. (Dizia a moça, apontando para a testa)

Julieta não tinha apenas um Romeu, mas vários. Todos inventados por ela, um por vez. Fazia amor com todos, amava nenhum. E quando enjoava, mandava-os para Otelo, MacBeth, Branca de Neve e até Rosalina. Os pobres Romeus rumavam perdidos nesses reinos estranhos, tudo por causa da Julieta. Não era por maldade, era apenas essa sua natureza caranguejeira, sanguessuga, vampiresca. Julieta era meio mulher, meio bicho. E esse bicho se alimentava de sexo e tesão. Quando acabava, Julieta se sentia morta.

Até que um dia surgiu um novo Romeu. Mas este Romeu não era um Montecchio, não mataria nenhum Teobaldo, não escalaria em nenhuma varanda e não tomaria nenhum veneno por Julieta.

Ela não conseguia entender, mas se ele a alimentasse, tudo bem. Não, não estava tudo bem. Julieta viu cores no cheiro de Romeu, sentiu a pele dele se fundir com a sua, suas pupilas dilatarem, seus batimentos cardíacos acelerarem, suas mãos ficarem frias e em seu estômago haviam borboletas. Não era apenas extravase, era mágica ou o que os alquimistas chamariam de química.

Romeu tinha cheiro de maçã, Julieta odiava maçã. Não a fruta em si, mas o status quo do pecado. Não entendia como a imbecil da Eva fora expulsa do Eden por uma reles maçã. Assim como não entendia estar obcecada pelo cheiro deste reles Romeu, que nunca habitou nenhum plano dela. Aliás, este Romeu era uma tragédia grega. Imaturo, disperso, gélido, inacessível, covarde, doce, engraçado, gentil. E não fazia esforço, era só tocá-la. Romeu era uma bagunça que Julieta não conseguia organizar.

Julieta perdeu o controle e o raciocínio. Não dormia, mal comia. Quis fazer uma lista com os defeitos de Romeu para lembrar de esquecê-lo, mas não passou de rascunho. Queria mandá-lo para outro reino, queria sua vida de volta. Era ela quem estava sendo sugada, afinal.

Julieta ficou tão louca, tão louca, que só viu saída em um vidrinho de veneno azul e vermelho, exatamente as cores no cheiro de Romeu. Tomou de súbito, em um desespero comovente.
Romeu assistiu a morte de Julieta sem mover uma ruga. Não por maldade ou falta de compaixão, apenas porque ele não era um de seus Romeus.